Você rola sua timeline e volta e meia se depara com eles. Em geral bem curtidos, carregam aquela aura de estudos consolidados. O propósito desse artigo é estimular uma pausa, um intervalo de questionamento entre recebê-los e aceitá-los.
Quando digo que gosto de aproximar o mundo acadêmico do corporativo, não é apenas tentando traduzir conteúdos complexos de lá pra cá. Também tem a ver com transmitir um pouco do rigor e do juízo crítico essenciais a quem deseja ampliar a visão.
Lifelong learning é lindo de falar, mas quantos estão interessados em ir atrás dos fundamentos e checar a consistência dos conteúdos que recebe?
Nessa pegada, resolvi pesquisar conceitos e frameworks que povoam palestras e treinamentos corporativos (além da timeline do In), para saber se ficam de pé. Será?
Se deseja prosseguir, se ajeite na cadeira e vamos nessa.
Pirâmide da Aprendizagem
De quem ela é? De saída, a autoria é controversa. Alguns apontam William Glasser, outros Edgar Dale (daí vira Cone da Aprendizagem) e até National Training Laboratories Institute (essa palestrante deve adorar, carregando no sotaque).
Pra não ficar só na crítica, a boa sacada é afirmar o posicionamento ativo do estudante, em contraponto ao meramente passivo.
Ok, mas esses percentuais em pirâmide... são a 'maquiagem científica' com que se vestem hoje uma enormidade de temas.
Compartilhados num click e sem check de realidade...
Se quiser ir mais fundo na desconstrução dessa pirâmide:
Estilos de Aprendizagem
Se algum palestrante te disser que o líder precisa identificar se fala com alguém auditivo, visual ou cinestésico, pergunte gentilmente "De onde veio isso?" e verifique que muitos não sabem, não se importam ou irão te enrolar com desvios.
Vamos lá: em 1987, Neil Fleming desenvolve e autopromove o VARK Learning Styles, que, através de um questionário, te sugere a melhor estratégia de aprendizem (Visual, Auditory, Reading ou Kinesthetic – daí a sigla VARK).
Ok, sabe-se que alunos tem preferências quanto à experiência de aprender, mas daí a rotulá-los a partir disso com trilhas diferentes de ensino... A correlação entre essas estratégias e a performance na aprendizagem é frágil ou nenhuma. Melhor mesmo é alternar as experiências.
Ainda assim, o VARK é popular e reproduzido por aí também como 'teste de personalidade', pois é...
Se quiser ir mais fundo na desconstrução desses estilos:
Múltiplas Inteligências
A ideia de vários tipos de inteligência sensibiliza nosso igualitarismo, todos podem ser 'inteligentes' de uma forma ou de outra, para além do velho QI.
Howard Gardner publica a teoria em 1983, mas o primeiro estudo empírico para testá-la só vem 23 anos depois (eita).
Apesar da fama, a teoria é criticada por psicólogos e educadores. Argumentam que as "oito inteligências" representam não mais que talentos, traços de personalidade, habilidades, além de carecerem de mensurabilidade para validação científica.
Ok, Gardner tece uma crítica ao teste de QI, cujo foco limitaria-se à inteligência linguístico-verbal e lógico-matemática, em detrimento de outros domínios, mas sua 'bem intencionada teoria' parece dar mais margem a belas frases inespecíficas (terreno fértil para palestrantes de formação duvidosa) do que para aplicações consistentes.
Se quiser ir mais fundo na desconstrução das múltiplas inteligências:
Golden Circle
Desde que Simon Sinek surge com seu simples e, por isso mesmo, muito cativante framework, a prevalência do Why sobre o How é bastante questionada.
Afinal, do que adianta um belo 'porquê' sem um 'como' bem feito?
Sinek ainda cai na esfarrapada simplificação neocórtex-racional x sistema límbico-emocional, localizando seu Why no miolo do Circle em correspondência ao que seria o miolo afetivo do cérebro, junk science reproduzida à exaustão em slides de festivos palestrantes corporativos.
Ok, o modelo de Sinek é considerado de relevância direta para aplicação em liderança, mas fica prejudicado pelas escorregadas de algumas de suas amarras.
Se quiser ir mais fundo no questionamento do Golden Circle:
Pirâmide de Maslow
A cultuada 'hierarquia das necessidades' é proposta em 1943, no livro “A Theory of Human Motivation” e, apesar das considerações posteriores de Maslow em 1954 – que vão muito além da ideia de uma hierarquia –, a pirâmide 'original' é até hoje onipresente quando o tema é motivação.
Pra piorar: só nos anos 60, Charles McDermid resolve apresentar a teoria de Maslow na forma de uma pirâmide, jamais concebida pelo autor.
De modo que, um best-seller como O Monge e o Executivo citar e incluir a pirâmide em suas páginas é algo digno do enredo de Roque Santeiro, novela sobre um mito que brilha à revelia de seu personagem real.
Bom, se necessidades do nível mais baixo devessem ser satisfeitas antes das de nível mais alto, como, por exemplo, médicos e professores poderiam apresentar tamanho comprometimento e energia mesmo em ambientes precários?
Se quiser ir mais fundo no verdadeiro Maslow:
Regra de Mehrabian
Já ouviu contar que, na comunicação, as palavras que usamos têm um peso de 7%, o tom de voz 38% e a linguagem corporal 55%?
A desconstrução dessa deixo para o cara da comunicação, Márcio Mussarela, em um dos episódios de sua for-mi-dá-vel série Papo Furado, confira aqui:
E também um artigo ótimo sobre o tema:
Bem, obrigado por ter lido até aqui. Espero ter aguçado sua consciência crítica na percepção de tudo o que recebe por aí. E também o cuidado na hora de compartilhar.
Questionar, pesquisar e fundamentar o que se fala é preciso :)
Por Haendel Motta
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