Sobre os incentivos embutidos na tecnologia; aqueles não aparentes, que não percebemos mas que existem
- CEU
- há 11 minutos
- 2 min de leitura

Quantas vezes você não se deparou com aquela dúvida cruel sobre como deve ser escrito o "porque", ou se a tal palavra é com "s" ou "z"? Some a isso o uso de vírgulas, reticências, concordância verbal e nominal, regência etc.
Você precisava estudar tais regras e fazer a revisão. Errava, aprendia, cometia novos erros e assim se mantinha o ciclo. Isso consumia muito tempo, energia e litros de "liquid paper" (não sei se a Gen Z conhece).
Vieram os corretores ortográficos como aquele no Word ou ainda mais especializados como Grammarly, sem falar nos mais recentes com IA. Sensacional!
Agilizam nossas vidas e evitam situações desconfortáveis principalmente no seu trabalho. De um ponto de vista utilitário é vantajoso e economiza tempo.
Entretanto, aqui reside um inventivo não aparente e embutido na tecnologia: o de não precisar mais estudar tais regras, nem aprimorar sua linguagem ou capacidade de argumentação.
Com o corretor ortográfico o "porque" sai correto e as vírgulas são corretamente usadas mas não necessariamente você assimilou o aprendizado. O incentivo é que não precise mesmo!
Com as tecnologias mais atuais, até mesmo clareza e concisão podem ser terceirizados para alguma IA. E não pára por aí: você não precisa sequer saber sobre o que está escrevendo. A IA generativa faz isso por você.
Aliás, escrever? Isso é coisa de primitivos! Digite. Digitar? Isso é tão anos 200"! Copie e cole o que a IA escrever para você. Copiar e colar? Isso é tão anos 2010! Fale e deixe a IA fazer o resto. Falar? Isso é tão anos 2020! Programe uma IA para postar automaticamente por você 3 vezes por semana sobre uma lista de assuntos durante o ano todo!
O ato de escrever (mesmo que digitando) é muito mais que saber as regras ou o se ater puramente ao resultado (o texto). Requer você pensar, formar narrativas fiéis aos seus pensamentos e que possam ser compreendidas pelos demais. Envolve cultura, comportamento, personalidade e valores que nos tornam indivíduos únicos e interessantes.
Com a IA generativa nós aprimoramos a produtividade individual mas retrocedemos na riqueza coletiva. Nasce um padrão único do que é uma boa escrita e articulação de ideias, plastificado e empacotado por uma IA.
Antes de comentar, esclareço: não é um convite para abolir essas tecnologias. Elas ajudam muito e funcionam! É sobre compreender os incentivos que podem estar embutidos ou nascerem com uma tecnologia, assim como seus efeitos não planejados e eventualmente indesejáveis.
A tecnologia não é boa, nem má, mas também não é neutra.
PS: A IA me sugeriu 16 correções. Não as fiz. Esse texto é meu, com todos os erros e acertos que representam meu repertório e esforço, e o aprendizado pessoal resultante disso vale mais para mim que a perfeição.
Bom fim de semana.
Por Ricardo Costa
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